segunda-feira, 29 de maio de 2017

Conversas d'Ouvido com Alvares


- "Que música gostarias que tocasse no teu funeral?"
- "The Day I Lost My Voice" Copeland.
Esta é apenas uma das perguntas que fizemos ao músico e compositor brasileiro Alvares. Após a edição do seu disco de estreia Sala de Estar Experimental, Vol. 1, lançou recentemente o novíssimo single "Livros em Branco de um Infinito Particular", no qual se direcciona para novas experiências sonoras, com recurso a sintetizadores e efeitos vocais.
Regressamos assim, novamente às "Terras de Santa Cruz", para conhecermos melhor Alvares, em mais uma edição das Conversas d'Ouvido...

Ouvido Alternativo: Como surgiu a paixão pela música?
Alvares: Primeiramente, obrigado pelo convite! Fico feliz de partilhar com vocês!
A música é uma forte conexão que sinto desde muito cedo. Na realidade é difícil lembrar de quando a música não esteve presente na minha vida. Meus pais ambos publicitários trabalharam durante anos com o segmento de rádio e tv, sempre voltados a música. Eu cresci em um ambiente que embora as pessoas não tocassem instrumentos eram muito ligadas a música. 
Na casa dos meus avós maternos onde vivi grande parte da minha infância o Jazz tomava conta das manhãs, tardes e noites. Era incrível! Foi natural meu interesse por isso desde criança. Aos 10 anos pedi um violão de aniversário e o resto é história.

O amor faz parte integrante da tua música, o que seria da Música, sem o amor e o desamor?
Acredito que mais o que amor, o relacionamento. E digo isso da forma mais abrangente possível. O amor/desamor é a ferramenta que muitos usam para se relacionar. Seja consigo mesmo ou com o próximo. Acho que eu tenho falado tanto de amor por ter vivido tanto amor. Admiro quem faz música sobre o amor e admiro ainda mais quem ama e consegue escrever sobre algo além do amor. Refletir-se na arte é primordial, mas ser autêntico, analítico e observador é algo para poucos.

Como gostas de descrever o teu estilo musical?
Nos últimos anos foram naturais as modificações da indústria fonográfica. Com a diversidade e tamanha pluralidade da minha geração acho que logo será impossível categorizar algo como estilo musical. Creio eu que a cultura do “Mood” tem vindo pra dominar tudo. Um bom exemplo/começo disso são as playlists das plataformas de streaming, tais como; “Folk pra relaxar”, “Indietronic”, “Noite de trabalho”, “Power Divas”. Cada vez mais a coisa toda vem se tornando plural, diversa e personalizada mudando de acordo com cada ouvinte ou faixa. Então não acredito muito mais nesse sentido de estilo musical. Porém ainda nos moldes convencionais acredito que: 
Alternativo ou indie. Lá atrás eu poderia dizer Emo ou algo do género. Mas hoje vejo o emo com outros olhos e acredito que se encaixe em outro perfil que não o meu. Apesar de eu ter em meu som uma forte influência de bandas desse estilo. 
Tem quem diga também que eu pareço com algo de MPB ou da NEO-MPB. As minhas referências são 90% estrangeiras então não acho justo com quem se espelha no rico cenário musical brasileiro me categorizar como algo assim.

Para além da música, tens mais alguma grande paixão?
Tem muitas coisas as quais eu admiro e gosto muito de fazer. Sou um grande fã de “arte moderna de computadores” ou como alguns chamam: design. Eu trabalho como diretor artístico/designer há 6 anos atendendo marcas, empresas e alguns artistas. Minha relação com o design é o mais próximo que tenho da minha relação com a música. Às vezes quando estou muito focado em produzir um disco ou uma música, a minha agenda está voltada para atividades fonográficas e fico longe dos softwares de criação me bate uma leve saudade. É gostoso isso, misturar os dois mundos e poder ser plural. 

Qual a maior vantagem e desvantagem da vida de um músico?
Acho que uma das grandes vantagens é ter “tempo livre para análise”. Claro que cada músico tem uma rotina/agenda e isso varia muito. Mas no meu caso acreditar que parte da minha tarefa como músico/compositor é analisar o comportamento humano. Tanto o meu quanto o próximo. É questionar, buscar os porquês das coisas. “Por que a gente ama?” “Por que a gente sente?” “Como as pessoas reagem a isso ou aquilo?”. Tentar responder essas dúvidas e ter tempo pra analisar é algo que pra mim não tem preço. 
Acredito que uma das desvantagens que muitos músicos têm, principalmente os que estão começando, é a dificuldade com as finanças. Viver de música no Brasil é uma tarefa extrema. Ela requer boas noções de administração, empreendedorismo e organização. Não basta ter somente o talento ou a vontade de dizer algo. Você precisa organizar: suas finanças pessoais, verba pros projetos, onde aplicar seu dinheiro e como garantir envelhecer com alguma fonte de renda. É algo que em um emprego tradicional o INSS e todas as garantias te resolvem. Aqui o jogo é indie (risos). Literalmente! 

Quais as tuas maiores influências musicais?
Atualmente não sei mais responder essa pergunta. Posso falar de artistas/bandas/djs que eu admiro bastante como: Rhye, Owen, Daft Punk, Copeland, Anchor & Braille, This Providence, Chet Faker, Valise, Broods e por aí vai. 
Sou um grande fã de música electrónica, talvez isso seja minha maior influência. Principalmente o pessoal de França. Esses caras, esses sabem do que eu to falando. 

Como preferes ouvir música? Cd, vinil, k-7, streaming, leitor mp3?
Vinil, sem sombra de dúvida! Eu pago o quanto for pra ter os discos que gosto.
Inclusive já cheguei a ficar esperando quatro meses por um disco do Rhye que importei.
Na rua é streaming né, que é o mais mobile. Já em casa é só vinil!

O streaming está a “matar” ou a “salvar” a música?
Acredito que o streaming está salvando. É um novo caminho, um começo. Uma forma ultra democrática onde qualquer artista pode ter rendimentos com música sem sair de casa. É claro, pagasse pouco ainda e tem falhas. Mas com toda certeza do mundo é o futuro. A internet pegou o mercado fonográfico e virou do avesso, agora está pondo tudo nos trilhos novamente. É uma questão de tempo até as coisas se adaptarem. 

Qual o disco da tua vida?
You Are My Sunshine, Copeland 

Qual o último disco que te deixou maravilhado?
Woman, Rhye

O que andas a ouvir de momento/Qual a tua mais recente descoberta musical?
L’Equipe Du Son com a track “Lesson 1” é incrível. Não paro de ouvir. 
O último disco do Beeshop é algo que achei muito legal também e ouvi bastante.

Qual a situação mais embaraçosa que já te aconteceu num concerto?
Quando se é músico independente você tem que estar pronto para todo tipo de situação com o público em shows. Inclusive a falta dele. Já no âmbito de deejays não é tão comum festas estarem vazias, na realidade é um fato muito raro. Pois bem, uma vez fui convidado para tocar em uma casa da zona sul carioca como dj.
Cheguei montei meu equipamento e o contratante falou pra já ir tocando que iriam abrir a casa. Até aí tudo bem. Toquei a primeira, a segunda, a terceira, a quarta e nada. Resultado: fiz um set de duas horas pra ninguém. Na esperança de chegar alguma alma viva. Quando eu já estava desmontando tudo veio o dono do club me deu um drink que segundo ele tinha feito pessoalmente pra mim e disse "se um dia eu gostar de fazer algo tanto assim como você gosta de tocar eu vou ser o homem mais feliz do mundo." Ainda sem entender muito bem o que tava rolando desci do palco ao lado de fora do club todos os garçons estavam me esperando e dizendo o quanto eles tinha curtido aquela noite. Foi algo bem estranho de um ponto de vista tradicional tocar pra ninguém mas muito recompensador ver que a equipe pelo menos se divertiu.

Com que músico/banda gostarias de efectuar um dueto/parceria?
Vou confessar que há uns cinco anos eu tento gravar uma música com o Lucas Silveira, do Fresno/Beeshop. Já estive com ele em umas três ou quatro situações nas quais levava meus discos/Ep's e meu contato pra ver se ele ouvia e a gente conseguia produzir algo juntos. A última foi agora tem uns três dias. Ele não me reconheceu, olhou pro disco e disse que ia ouvir no Youtube pois em casa não tinha um leitor de CD. Continuo na esperança, quem sabe um dia rola ou desisto. (risos)

Para quem gostarias de abrir um concerto?
Com toda certeza do mundo pro Rhye. Apesar de que abrir pro Two Door Cinema Club deve ser incrível e os caras parecem ser muito legais. 

Em que palco (nacional ou internacional) gostarias um dia de actuar?
Burning Man! 

Qual o melhor concerto a que já assististe?
Rhye, na sacadura154, na festa de cinco anos do Queremos! 

Que artista ou banda gostavas de ver ao vivo e ainda não tiveste oportunidade?
Copeland, Daft Punk, Owen, American Football e do Nick Santino (que era do A Rocket To The Moon).

Qual o concerto da história (pode ser longínqua, mesmo antes de teres nascido) em que gostarias de ter estado presente?
Daft Punk no Coachella! 

Qual o teu guilty pleasure musical?
Pra ser sincero acho que não tenho.

Projectos para o futuro?
Produzir um novo álbum focado em apresentações ao vivo. O último que gravei “Sala de Estar Experimental – Volume 01.” tem muitas camadas de sintetizador, dobras de voz e coisas um pouco complicadas para reproduzir ao vivo no momento.

Que pergunta gostarias que te fizessem e nunca foi colocada? E qual a resposta.
Difícil essa hein! Acredito que nenhuma.

Que música gostarias que tocasse no teu funeral?

Obrigado pelo tempo despendido, boa sorte para o futuro.  
Eu que agradeço, até a próxima!

Terminamos ao som da Alvares e do seu single "Livros em Branco de um Infinito Particular" 

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