Fotógrafa - Hannah Carvalho |
Entrevista com My Magical Glowing Lens, projecto de Gabriela Deptulski, cantora, compositora e multi-instrumentista brasileira. Guitarra, voz, baixo, bateria e sintetizador, Gabriela incorpora a música dentro de si e ao transmiti-la convida-nos para embarcarmos numa alucinante viagem cósmica rumo a uma dimensão desconhecida. A sua sonoridade espacial percorre diversas galáxias, desde o dream-pop, ao rock, passando pelo psicadélico. No ano passado editou o elogiado álbum, "Cosmos". My Magical Glowing Lens são um dos segredos mais bem guardados da música brasileira e chegam agora ao Ouvido Alternativo para mais uma edição das "Conversas d'Ouvido"...
Ouvido Alternativo: Como surgiu a paixão pela música?
Gabriela Deptulski: Olá, Como vai? Não sei dizer bem, talvez ouvindo o vinil “Rubi” do Alceu Valença ou “Os Saltimbancos” com a versão do Chico, quando eu era ainda uma criança. Ou quando minha mãe cantava “Força Estranha” do Caetano pra eu dormir. Ou quando ouvi a canção “Cantiga da Mata” de meu pai, também quando pequena, ele tocando na varanda à meia luz. Eu nunca tinha ouvido uma canção inétida ao vivo. Era só voz e violão, falava sobre a mata, natureza e criaturas do folclore brasileiro, uma canção realmente mágica, me tocou profundamente naquele momento.
Como surgiu o nome My Magical Glowing Lens?
Surgiu comigo tentando dar o nome para as minhas piras de mixagem 3D que nos levaria para uma dimensão desconhecida. A ideia do nome foi para apontar que a MMGL seria uma lente mágica que faria a gente sair dessa dimensão e partir pra outra! Nessa época eu estava no final do mestrado em filosofia e pesquisava muito sobre física quântica.
My Magical Glowing Lens - "Cosmos" |
Editaste este ano o disco de estreia “Cosmos”, que nos convida para uma viagem espacial, acreditas que há alguma espécie de vida fora do Planeta Terra?
Não sei dizer, sou ligada ao espaço sideral desde a prmeira vez que estudei os planetas na escola. Não sei por quê. Deve ter alguma coisa importante lá. Às vezes sinto que não sou daqui, e sim de lá... Já vi muito OVNIS, principalmente em uma viagem mística que fiz até São Thomé das Letras. E já senti a presença de algo extra-terrestre uma vez, no meu quarto. E já ouvi muitos relatos sobre aparições. Mas realmente não sei. Tenho uma mente um pouco científica demais pra acreditar sem ver, acho que não acreditarei totalmente até eles entrarem em contato comigo.
“Cosmos”, tem sido elogiado pela crítica, estavas à espera de tamanha reacção?
Nunca pensei que conseguiria me expressar completamente, os sentimentos que me aparecem e expresso nas músicas são absurdos, bem intensos e complexos, contra muitas regras que seguimos há séculos, talvez milênios. Nunca imaginei que as pessoas poderiam entender isso. Foi uma surpresa muito linda ver as pessoas compreendendo tudo e vê-las dividindo isso comigo.
Guitarra, baixo, bateria, voz, sintetizadores, produção, arranjos, tu não descansas? Ou preferes ter o controlo sobre a tua música?
Eu não descanso... não me lembro da última vez que descansei. Até quando estou parada meditando, estou trabalhando. Componho a maioria das músicas sonhando, então até dormindo eu tô trabalhando. Sobre o controle, uma vez vi uma entrevista com o Jodorowsky e ele dizia algo do tipo: “Quando tenho a ideia sobre um filme, ele aparece pra mim com cada detalhe, ele vem inteiro na minha cabeça e eu não sossego até conseguir fazê-lo exatamente como ele apareceu pra mim”. É bem isso que sinto! É o contrário do controle, é deixar fluir de modo completamente livre uma visão que te apareceu, sem entraves, respeitando tudo que essa visão te doa. É o fluxo intenso da criação... Se você divide isso com alguém, você precisa comunicar exatamente a visão absurdamente linda que o destino te deu de presente, você precisa falar nos mínimos detalhes a mágica que ocorreu ali, a música completa. Até a outra pessoa entender o que você viu, já se passariam anos... porque é tudo muito interligado e complexo, não sei explicar, é a mágica que acontece dentro de mim, não sei o que é isso. Minhas músicas nem são minhas, são dessa “voz” que as sopra pra mim. Me desviar do que minhas músicas me mandam fazer seria um desrespeito com essa mensagem que me foi passada quase que sobrenaturalmente. É o contrário de controle, não tenho controle nenhum sobre minha arte, é ela quem me controla o tempo todo. Sou só um meio para as mensagens que a música me manda. Isso era comum na época clássica, com os compositores clássicos que compunham e arranjavam tudo. Hoje em dia as pessoas dividem as funções pra ficar mais fácil. O que é lindo e uma delícia de se fazer! Mas no MMGL, como começou assim, prefiro respeitar o modo que isso surgiu e deixar a composição fluir naturalmente dentro de mim e ir passando isso pro mundo concreto do modo como tenho feito, compondo arranjos para todos os intrumentos e decidindo qual o timbre e o lugar de cada elemento na mix. Se algum dia encontrar uma pessoa que consiga entender o que o MMGL tenta fazer conosco, não hesitarei em dividir isso, mas isso não acontceu ainda.
Como gostas de descrever o teu estilo musical?
Chamo de pop místico, mas é só uma brincadeira isso. Eu não sei o que é. As músicas apenas surgem.
Para além da música, tens mais alguma grande paixão?
Sim, literatura. E busca por elevação espiritual.
Qual a maior vantagem e desvantagem da vida de um músico?
Atualmente penso que só tem vantagem. Você perde já ganhando, é muito louco.
Quais as tuas maiores influências musicais?
Catavento, The Muddy Brothers, Jimi Hendrix, Karen Dalton, M.I.A, Rita Lee, Melody Prochet, Kevin Parker, Bike, Ventre, Clube da Esquina, Os Mutantes, Arnaldo Baptista, Alceu Valença, Sonic Youth, Nirvana, Cream, Son House, Carne Doce, Boogarins, Tagore, Racionais, Flora Matos, The Beatles, Pink Floyd, Céu, Primal Scream, Syd Barrett, The Flaming Lips, Big Star, Stealers Wheel, Perfume Azul do Sol, The Beach Boys, Rihanna, Lorde, Ok Lou, St. Vincent... devo ter esquecido algumas, são muitas!
Como preferes ouvir música? Cd, vinil, k-7, streaming, leitor mp3?
Mp3, baixo tudo pelo SoulSeek. Vim de família com pouco dinheiro, não tenho grana hoje em dia (risos) e tenho uma fome insaciável por música. Então é minha única saída. Pesquiso músicas conhecidas e raras no SoulSeek desde meus 12 anos, tenho um acervo bem grande, então meu campo de estudo é ali e o mp3 salvou minha vida!
Qual o disco da tua vida?
Que pergunta difícil... Acho que o “The Piper at The Gates of Dawn” com as composições do Syd Barrett do Pink Floyd.
Qual o último disco que te deixou maravilhada?
“Nascimento” da banda Perfume Azul do Sol de 1974.
O que andas a ouvir de momento/Qual a tua mais recente descoberta musical?
Eu ando fazendo uma pesquisa que agrega músicas japonesas, chinesas, egípcias, indianas, africanas, italianas... ou seja, de vários lugares do mundo. É o que tem mais me encantado ultimamente, essas descobertas na “deep web” de músicas que nunca ouvi na vida e que é muito difícil de achar. Mas ando ouvindo muito Flora Matos nos útimos dias. O último álbum dela me pegou de jeito.
Qual a situação mais embaraçosa que já te aconteceu num concerto?
Sempre tem isso (risos)! Tem um vídeo que fizeram no Festival Picnik que é bem engraçado. Eu gosto muito de sair do palco e ir pra plateia, num ímpeto de desvincular o artista do palco, pras pessoas entenderem que o palco é qualquer lugar e que elas também podem se libertar ali. Ou então fico deitada no chão fazendo música concreta na guitarra. Ou então apenas grito no microfone. Isso é sempre embaraçoso de se ver depois (risos).
Com que músico/banda gostarias de efectuar um dueto/parceria?
Muito. Amo parcerias, já fiz uma com a banda The Post Nobles (“Windy Streets” e “Cosmic Love Trip”) e existe outra em andamento com a Bike. Gostaria de fazer parceria com Tagore, Papisa, Finger Fingerrr, Boogarins, Hierofante Púrpura, Bonifrate, Ventre, Carne Doce, The Muddy Brothers e com todas as minhas amigas e amigos que tocam e cantam.
Para quem gostarias de abrir um concerto?
Melody’s Echo Chamber, sem dúvida!
Em que palco (nacional ou internacional) gostarias um dia de actuar?
Gostaria muito de tocar no PopLoad e no Lollapalooza aqui no Brasil, no Primavera Sound na Espanha ou em algum festival do King Gizzard. No Coachella também seria legal. Mas eu não tenho muito essa pira com tocar em palcos ou festivais específicos, às vezes os melhores shows são em casas pequenas deconhecidas com pessoas mágicas. Mas eu gostaria muito de fazer uma tournê pela Austrália. É um sonho antigo isso!
Qual o melhor concerto a que já assististe?
Tame Impala no Circo Voador em 2014.
Que artista ou banda gostavas de ver ao vivo e ainda não tiveste oportunidade?
St. Vincent, Melody’s Echo Chamber, Cidadão Instigado, The Flaming Lips.
Qual o concerto da história (pode ser longínqua, mesmo antes de teres nascido) em que gostarias de ter estado presente?
Queria muito estar chapada e presente em um show do Jefferson Airplane no Altamont Festival, provavelmente em 1960 isso. Tem no youtube isso, é bastante intenso.
Tens algum guilty pleasure musical?
Eu curto muito Britney e Jutin Bieber, mas pensando bem não tenho culpa por gostar deles, eles são realmente demais.
Projectos para o futuro?
Produzir música para outras pessoas. Fazer uma turnê internacional. Lançar um disco cheio em 2018 ou 2019. Ser uma pessoa melhor. Me tornar menos egoísta. Deixar as pessoas ao meu redor mais felizes. Ser mais feliz. Tentar impedir que o Bolsonaro ganhe ou que a gangue Temer continue no poder aqui no Brasil.
Que pergunta gostarias que te fizessem e nunca foi colocada? E qual a resposta?
Que música de outro artista, gostarias que tivesse sido composta por ti?
“Burning of the Midnight Lamp” do Jimi Hendrix.
Que música gostarias que tocasse no teu funeral?
Chamaria o Caramuru e Julião pra todo mundo dançar um forró bem arretado.
Obrigado pelo tempo despendido, boa sorte para o futuro
Eu que agradeço! :)
Antes de nos despedirmos, ficamos ao som do mais recente disco de My Magical Glowing Lens, "Cosmos", que se encontra disponível para escuta na plataforma Bandcamp.
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