Entrevista com a cantora e compositora Nádia Schilling, natural das Caldas da Rainha, estudou arquitectura paisagista, outra das suas paixões, além da música. Integra a banda Loopooloo, com a qual navega nas águas do rock alternativo/dream-pop, a solo percorre os caminhos da folk, do rock e do jazz.
No ano transacto, editou uma verdadeira relíquia, "Above The Trees", a sua primeira aventura a solo e que figurou na nossa lista de melhores discos nacionais do ano. Um álbum íntimo e pessoal, que a "ajudou" a ultrapassar a "ausência" da mãe. O ano de 2018, marca a sua estreia nas "Conversas d'Ouvido"...
Ouvido Alternativo: Como surgiu a paixão pela música?
Nádia Schilling: Terá surgido desde muito cedo, provavelmente influenciada pelo facto de a minha mãe sempre ter ouvido muita música. Quando era miúda era costume acordar com os discos dela no gira-discos e ela ouvia coisas muito diferentes, música clássica, folk, bossa nova. Outra influência terá vindo dos meus avós que para além das suas profissões eram músicos clássicos. O meu avô paterno foi ainda um apaixonado por jazz e uma das bonitas memórias que tenho dele, é a de ouvi-lo cantar, com 93 anos, uma música do Nat King Cole.
O apelido Schilling não é português, qual a tua ascendência?
Schilling é um nome alemão, mas a minha ascendência é ainda polaca, italiana, portuguesa e até indiana (goesa).
Editaste este ano o disco de estreia “Above The Trees”, um disco muito pessoal, para quem ainda não ouviu o que podemos esperar?
Um disco que teve um percurso longo e que resulta de uma procura da beleza que existe nas coisas tristes. Ao mesmo tempo é uma forma de tributo a pessoas que me marcaram.
Apesar de te teres aventurado a solo, este disco, contém diversas participações, queres apresentar-nos os músicos que te acompanham neste álbum?
Tive muita sorte porque consegui incluir neste disco uma série de amigos que são músicos com um talento indiscutível. Neste disco participaram muitas pessoas e como a lista é longa vou falar apenas de algumas que tiveram um papel mais fundamental: um deles foi o Filipe Melo que é um pianista, arranjador, autor de BD e realizador, o João Hasselberg que é baixista mas também compositor (com dois discos incríveis que vale a pena ouvir), e o Bruno Pedroso que é um baterista histórico e um virtuoso do assobio. Como convidados pude contar com o João Firmino e com o Mário Delgado nas guitarras, e com a cantora brasileira Marina Vello que canta comigo uma música chamada “Misfire”.
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| Nádia Schilling - "Above The Trees" |
O João Pombeiro, tem sido responsável pelos artworks, no entanto ficamos intrigados com a capa, podes explicar-nos qual a simbologia?
O João Pombeiro é responsável por todo o artwork e pelo videoclipe do primeiro single "Kite" (que anda a percorrer o mundo numa série de festivais de cinema), e fez um trabalho incrível. A capa do disco, no entanto, é uma adaptação de uma colagem feita pela minha mãe quando eu era criança e que encontrei há cerca de dois anos, completamente por acaso, enquanto mexia numa caixa de fotografias.
Como gostas de descrever o teu estilo musical?
A minha música resulta de tantas influências que não sei muito bem definir o meu estilo. Há quem o descreva como “indie-jazz-luso-germânico”. Eu acho que pertence mais ao rock alternativo.
Para além da música, tens mais alguma grande paixão?
Adoro aprender coisas e ganhar assim novas ferramentas. Gosto também muito de ler e de escrever. Tenho uma paixão pela natureza e gosto de interagir com animais. Domésticos e outros. A arquitectura paisagista é outra paixão. Adoro fotografias antigas. Acho que poderia continuar a responder. Descobri neste momento e com esta pergunta que gosto de muitas coisas.
Qual a maior vantagem e desvantagem da vida de um músico?
Sendo a minha profissão principal a arquitectura paisagista e no mundo dos projectos o tempo que decorre entre uma ideia e a sua concretização poder ser muito longo (pode demorar 10 anos, por exemplo), considero que a principal vantagem seja, a de a música ser algo muito imediato. É uma coisa muito do momento. Essa espontaneidade é uma característica incrível.
A maior desvantagem é o facto de haver tanta música hoje em dia que as pessoas já a banalizam, já não dão o devido valor a muitos projectos musicais que mereceriam um pouco mais de atenção. Nos anos 50 o meu avô mandava vir um disco de jazz dos Estados Unidos e quando o disco chegava era um grande acontecimento. Não só para ele, mas para os seus amigos. Convidava-os então para um serão onde ficavam em silêncio a ouvir o disco novo do início ao fim, com alguma cerimónia.
Quais as tuas maiores influências musicais?
The Beatles, Nick Cave, Nick Drake, Beck, The Magnetic Fields, Fiona Apple, Jeff Buckley, Jon Brion, Portishead, Blossom Dearie, Nat King Cole, Tom Jobim, Elis Regina, Chet Baker, Aimee Mann, Cat Power.
Como preferes ouvir música? Cd, vinil, k-7, streaming, leitor mp3?
Gosto de todos os formatos, mas hoje em dia (e apesar de continuar a gostar muito de ter os discos na mão), prefiro o streaming, desde que com qualidade, por ser mais prático.
Qual o disco da tua vida?
Tenho muitos, mas o disco do Duke Ellington e do John Coltrane (que se chama mesmo "Duke Ellington ＆ John Coltrane"), é muito bonito e tem uma música que se chama "My Little Brown Book" que adoro e que ouvi centenas de vezes, por isso vou escolher este.
Qual o último disco que te deixou maravilhado?
"50 Song Memoir" dos The Magnetic Fields.
O que andas a ouvir de momento/Qual a tua mais recente descoberta musical?
Ando a ouvir Angel Olsen, Cate le Bon, Sharon Van Etten, Cigarettes After Sex, Paul Simon.
Qual a situação mais embaraçosa que já te aconteceu num concerto?
Provavelmente ter de improvisar um solo vocal. É precisa muita experiência e bom gosto para se fazer um bom solo vocal e os “papapatapararara” cantados por mim, pareceram-me tolos. Fiquei embaraçada.
Com que músico/banda gostarias de efectuar um dueto/parceria?
Parceria realista: gostava de trabalhar com o músico/produtor brasileiro Adriano Cintra. Somos amigos e é uma das pessoas que ficou a faltar neste disco. A parceria irrealista: adorava trabalhar com o Jon Brion.
Para quem gostarias de abrir um concerto?
Talvez para o Beck. Já falei uma vez com o pai do Beck. Por isso talvez um dia seja possível.
Em que palco (nacional ou internacional) gostarias um dia de actuar?
No palco do Muppet Show acompanhada pela banda residente Dr. Teeth and The Electric Mayhem.
Qual o melhor concerto a que já assististe?
Não consigo escolher um melhor, gostei de vários. Gostei muito de ver os The Magnetic Fields, o Ryan Adams ou os Yo La Tengo na Aula Magna, por exemplo. Também gostei mesmo muito de ver o Nick Cave no Coliseu.
Que artista ou banda gostavas de ver ao vivo e ainda não tiveste oportunidade?
São muitos, mas neste momento lembro-me do Samuel Úria. Nunca tive oportunidade de ver um concerto dele.
Qual o concerto da história (pode ser longínqua, mesmo antes de teres nascido) em que gostarias de ter estado presente?
Qualquer concerto nos primeiros anos dos The Velvet Underground.
Tens algum guilty pleasure musical?
Já não tenho guilty pleasures hoje em dia. Se gosto, gosto. Mesmo de canção italiana dramática.
Projectos para o futuro?
Tocar o disco que fiz, ao vivo.
Que pergunta gostarias que te fizessem e nunca foi colocada? E qual a resposta.
P: Qual a melhor coisa que trouxe este disco?
R: Este disco juntou um grupo de pessoas com um enorme talento, a trabalhar com o objectivo de fazer algo bem feito e bonito. Nunca tinha assistido a algo assim, com esta escala e isso marcou-me.
Que música de outro artista, gostarias que tivesse sido composta por ti?
A "Bohemian Rhapsody" (Freddie Mercury), a "Absolute Begginers" (David Bowie), "A Day In The Life" (The Beatles). Não consigo responder só uma.
Que música gostarias que tocasse no teu funeral?
Música do Tom Jobim. Qualquer uma.
Obrigado pelo tempo despendido, boa sorte para o futuro.
Apresentamos agora o último disco de Nádia Schilling, "Above The Trees", editado no último trimestre do ano passado e que se encontra disponível para escuta através da plataforma Bandcamp.
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